Blog Esalqueanos
A Retórica da Reação (Musgo)
30/06/2015 - Por celso luis rodrigues vegroAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

viagra torta
viagra cena
Em 1991, Albert Hirschman, talvez o economista mais
influente na produção teórica sobre questões pertinentes ao desenvolvimento das
nações retardatárias, publicou: “The
Rethoric of Reaction”(1)cuja hipótese consistia em compreender o
estabelecimento de reações decorrentes das ações sob o pretexto de que o agir é perverso, fútil e custoso. Tal
discurso de natureza conservadora/reacionária, criticada pelo autor, sedimentou
bases para o neoliberalismo que se espraiou globalmente, especialmente na
iberoamérica, a partir das diretrizes políticas adotadas por Thatcher (RU) e
Reagan (EUA) ao final dos oitenta e início dos noventa.
Paralelamente, também nos anos 80, nos países
sulamericanos esgotaram-se as orientações políticas visando a substituições de
importações pautada na autarquia dos mercados (olhar para dentro), que
associada a crise do endividamento externo e a escala da inflacionária, obrigou
completo redirecionamento das ações públicas destinadas a propagar o
crescimento econômico.
O alicerce que moldou a política de substituição das
importações(2) foi a premissa da deterioração dos termos de intercâmbio(3),
construída por economistas latino-americanos que flertaram com o pensamento de
Hirschman, dentre os quais Prebisch, Furtado, Cardoso, Faletto e Fajnzylber –
vulgo cepalinos. O fundamento básico da teoria consistia na constatação de que
países periféricos produtores de matérias primas básicas (agrícolas e
minerais), no longo prazo, exibiam declínio do valor real dos produtos de sua
pauta exportadora, enquanto os produtos industrializados provenientes dos
países centrais, comparativamente, possuíam maior nível de apuro tecnológico e,
consequentemente, maiores valor agregado e estabilidade de seus preços,
estabelecendo-se assim, por meio do comércio internacional, crescente
descolamento dos retardatários das possibilidades de superarem seu
subdesenvolvimento. Industrializar, portanto, consistia na chave de ignição
para fazer girar o motor do desenvolvimento rumo a superação da dependência.
Ainda que a substituição de importações tenha perdido sua
consistência enquanto política desenvolvimentista (estrangulada pela baixa taxa
de poupança interna com crescente expansão do déficit púbico) foi sobrepujada
tanto pela necessidade de maior abertura comercial quanto pela inserção em
blocos econômicos dinâmicos, a tendência de longo prazo de deterioração dos
termos de intercâmbio persiste, mantendo sua clássica orientação (sempre
negativa). Entremeados por poucos picos, a linha e tendência da trajetória dos
preços das commodities é acentuadamente negativa (Figura 1).
Figura
1 – Preços reais ponderado de cesta de commodities, 1913-2014
Fonte:
Passos, 2015(4).
A partir dos anos 90, adotou-se
modelo de desenvolvimento alternativo a substituição de importação, que porém,
não se refreou a tendência de deterioração dos termos de intercâmbio. Tampouco
logrou superar a polaridade centro-periferia na medida que o fluxo de capital
que se destinava aos países ibero-americanos, tradicionalmente, se concentrava
nos segmentos dos produtos exportáveis (matérias-primas básicas), não
estabelecendo vínculos locais capazes de romper com os enclaves de excelência
desconectados do resto do país.
De certa maneira, o recente debate sobre o precoce processo de desindustrialização brasileira remete ao contexto acima explicitado. A crescente preponderância de matérias primas agrícolas na pauta exportadora associada, em sua maior parcela, ao limitado avanço na cadeia de valor, voltariam a condenar o país a um regime de dependência e de subdesenvolvimento inaceitáveis na atualidade. Assim, constituem-se nos principais desafios aos policy makers o estabelecimento de bases para a retomada do investimento industrial e o apoio aos esforços que agreguem valor as commodities (agrícolas e minerais)
Por sua vez, a tendência para os preços no mercado de café arábica é irmã siamesa da trajetória geral delineada pela Figura 1. Efêmeros momentos de picos contra longos períodos de baixas (Figura 2).
Figura
2 – Preços médios reais(5) recebidos pelos cafeicultores paulistas,
1994-2014
Fonte:
Instituto de Economia Agrícola(6).
A deterioração dos termos de
intercâmbio esparramará vítimas. Os cafeicultores terão que se empenhar muito
no aumento de produtividade com qualidade, certificar a produção e,
eventualmente, verticalizar a produção para se manter viáveis economicamente.
Porém, a não ser que ocorra um milagre produtivo, similar a clonagem do robusta
capixaba para o arábica, todo esse empenho ainda assim será insuficiente para
garantir a rentabilidade do empreendimento a longo prazo.
Recentemente, lideranças do segmento
produtivo se arvoraram contra a importação de café arábica(7). A
inciativa compunha tópico de tratativas efetuadas pelo governo de Minas Gerais
e de transnacional líder no segmento de cápsulas, visando atrair para seu
território empreendimento agroindustrial. O apoio na facilitação das
importações concretizou a meta de implantação da empresa pois garantiria a
constituição de suas ligas.
O êxito das lideranças em bloquear a entrada de café
importado, indiretamente, condena os cafeicultores a permanecerem reféns do
declínio de longo prazo dos preços recebidos. Por outro lado, o avanço do
processamento por meio da agroindustrilização do produto, estabelece modalidades
alternativas de comercialização, ainda que não tenham garantia de trazer
vantagens imediatas aos cafeicultores, constituem-se em passo importante em
transformar o país em plataforma global para negócios em café, objetivo que
deveria ser obcessivamente perseguido diante da tendência de deterioração dos
termos de intercâmbio8.
A manutenção da reserva do mercado brasileiro ao produto
nacional torna-se mais anacrônica ainda diante do boom de importações de
cápsulas que, recentemente, receberam tratamento tributário diferenciado.
Ademais, ao se fechar ao exterior o segmento reforça a imagem dos demais países
fronteiriços de país imperialista, incapaz de estreitar laços econômicos de
tipo ganha-ganha com seus vizinhos.
A ciência econômica não tem capacidade em estabelecer
resultados perfeitamente predizíeis, entretanto, fechar-se ao exterior já
provou ser política que não resulta em ganhos de bem estar e de avanço no
processo de desenvolvimento. Lamentavelmente, os políticos misturam teoria
econômica com retórica destinada a combater as novas ações (retórica da
reação). Os cafeicultores, por sua vez, precisam perceber que o sedutor
discurso político contra as importações é um verdadeiro tiro no pé.
1 HIRSCHMAN,
A. O.
The Rhetoric of Reaction. perversity,
futility, jeopardy. Cambridge (Mass.): Harvard University Press.
1991.
2 Ver: CARDOSO,
E & HELWEGE, A. A economia da
América Latina. Editora ática, São Paulo, 1993. 336p.
3 PASSOS,
A. Tendência ao declínio secular está de volta às commodities? Jornal Valor
Econômico, 14/05/2015. Disponível em: http://www.valor.com.br/opiniao/4048960/tendencia-ao-declinio-secular-esta-de-volta-commodities
4 Também,
alicerçou-se na premissa do crescimento induzido pela demanda, elemento crucial
na arquitetura política sob as presidências de Cardoso I e II, Lula I e II e
Dilma I.
5 Base 1 = 1994. Disponível em: http://web.ipead.face.ufmg.br/site/atualizacaoAtivos
6 Disponível
em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/precos_medios.aspx?cod_sis=2
7 É
errôneo o sedimentado conceito de que, o Brasil, possui cardápio de origens e
bebidas que cobrem todo o espectro de sabores e aromas existentes dentre a
diversidade de origens produzidas no mundo.
8 Prefere-se
repetir a cantilena de que a Alemanha fatura mais que o Brasil sem ter um único
pé de café, do que se emprenhar ativamente em mudar esse fato por meio de mais
e melhores indústrias processando nossas matérias primas e a elas adicionando
mais valor.
Celso Luis Rodrigues Vegro (Musgo F86) é Eng. Agrônomo Pesquisador Científico do IEA, Ex morador da Casa do Estudante e agregado da Republica Latifúndio
Email para contato - celvegro@iea.sp.gov.br